Economista aponta alternativas para gerir orçamento familiar e aplicar recursos extras
A convite da CDL-BG, coordenadora do curso de Ciências Contábeis da UCS, Jacqueline Maria Corá, explica como é possível adequar o planejamento e fugir da inadimplência
Manter o planejamento financeiro tornou-se um desafio para muitas pessoas por causa do cenário de instabilidade decorrente da pandemia da covid-19. Acompanhando as incertezas, a redução repentina de renda mexeu com o orçamento das famílias. Com dados exclusivos provenientes do SPC Brasil, a Câmara de Dirigentes Lojistas de Bento Gonçalves identificou que nos meses de março (início da pandemia) e abril, o número de inclusões no SPC (ou seja, novos nomes negativados por falta de pagamento de dívidas) diminuiu cerca de 64% no município (-33% em março e -31% em abril). Isso foi consequência dos períodos em que as lojas permaneceram de portas fechadas e, também, do posicionamento de muitos lojistas, praticando a empatia por conta do momento delicado pelo qual todos começaram a passar. Porém, em maio, as inclusões no SPC cresceram 230% no comparativo com o mês anterior (abril). Depois desse pico, a número de novas inclusões voltou a cair: -10% em junho e -51% em julho.
“Esse dado precisa ser avaliado de forma conjunta com as exclusões (ou seja, percentual de pessoas que tiveram seu ‘nome limpo’, ou seja, que quitaram a dívida e saíram do SPC): em maio, houve aumento de 53% no número de exclusões (no comparativo com abril) e, em junho, crescimento de 137% no total de exclusões (no comparativo com o mês anterior). Esse cenário indica um movimento claro, por parte do consumidor, de interesse em buscar o pagamento de suas dívidas”, explica o presidente Marcos Carbone.
Nesse contexto, recursos extras, como o saque do FGTS e o auxílio emergencial, podem ajudar quem deseja limpar o nome na praça, na opinião da economista Jacqueline Maria Corá, coordenadora do curso de Ciências Contábeis da Universidade de Caxias do Sul, doutoranda em Turismo e mestre em Administração e Marketing. Segundo ela, o Brasil passou por um longo tempo convivendo com taxas elevadas de inflação, inibindo qualquer iniciativa em termos de planejamento. “Pelo menos duas gerações não aprenderam a se planejar economicamente. É necessário, portanto, investimentos em educação financeira”, garante.
A ausência desse controle geralmente faz com que as pessoas acessem créditos com altas taxas de juros. Assim, a pergunta que fica é: ao se deparar com essa situação, como é possível sair das dívidas? De acordo com a economista, quando não há planejamento, fica complicado antecipar os problemas e, por consequência, estar preparado para enfrenta-los. “A situação pela qual estamos passando, em que muitas famílias estavam despreparadas, sem nenhuma reserva financeira para enfrentar estes tempos difíceis da pandemia, evidencia muito bem essa questão. O planejamento nos permite destinar parte da nossa renda para uma reserva emergencial e outra parte para atender aos nossos planos de longo prazo”, considera.
Essa reserva, inclusive, diminui as chances de os consumidores buscarem o uso do cheque-especial, por exemplo, recorrendo a financiamentos e outros meios em que a taxa de juros é elevada. “Quando estamos endividados, a primeira coisa a fazer é parar de gastar. Parece difícil fazer isso, e de fato é. Porém, temos que parar de aumentar o problema. Assim, deve-se, num primeiro momento, manter apenas os gastos essenciais e muito necessários. Em seguida, passamos a fazer um levantamento detalhado das dívidas – priorizando aquelas em que as taxas de juros são maiores, as que podemos negociar com o credor e aquelas que podem aguardar mais um pouco. Precisamos ter a ideia exata do montante de nossa dívida”, avalia.
Para o êxito do planejamento, a especialista indica a união familiar em torno de um propósito comum: estabelecer limites e cumpri-los. “Para isso, toda a família deve estar ciente e comprometida com os resultados. A medida em que todos vão percebendo os bons resultados, será possível aprender novas formas de economizar e organizar as finanças domésticas”, sentencia.
Como aplicar corretamente os recursos extras
A utilização dos recursos do auxílio emergencial e do saque do FGTS liberados pelo governo, por exemplo, depende muito da situação de cada pessoa. Conforme Jacqueline, quem deve retirar o dinheiro do fundo de garantia são os indivíduos que têm dívidas ou que estão sem renda e precisam do valor para bancar as despesas do momento. Quem está em dúvida quanto a continuidade de sua renda no curto prazo também deve optar pela retirada – podendo aplicar em renda fixa que lhe dará a liquidez necessária para quando for usar o valor.
Já para quem está em situação confortável, sem dívidas e com reserva de emergência, a melhor opção é retirar para aplicar em um fundo – multimercado com prazo mais alongado ou aplicar em títulos do tesouro com prazo mais longo que remunera melhor. Os aposentados, por sua vez, poderão deixar o valor no fundo mesmo, que garante uma remuneração de 3% sem risco. “Mas vale ressaltar: a postura em relação aos investimentos depende fundamentalmente do objetivo para utilização do valor e do perfil do investidor”, argumenta.
Dicas práticas para administrar seu orçamento:
– Faça um planejamento para usar os recursos extras;
– Corte todos os gastos desnecessários;
– Converse com a família e garanta o comprometimento de todos;
– Compre do comércio e fortaleça o emprego local;
– Mude hábitos e introduza a prática de guardar uma parte de sua renda;
– Entenda que o endividamento não acontece porque se ganha pouco, mas sim pela forma como gastamos.